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sexta-feira, 14 de maio de 2010

Carta aberta a José Sócrates

Ex-mo Senhor Primeiro-Ministro
Engº José Sócrates:

Como cidadã, que sempre procurou cumprir com os seus deveres cívicos, em prol dos interesses do nosso país, dirijo a V. Ex.ª esta missiva após ter escutado, com a máxima atenção, a comunicação que dirigiu ao país, logo a seguir ao final da reunião do Conselho de Ministros extraordinária de hoje, na qual se discutiram as medidas extraordinárias a incluir no PEC.
Pelo que entendi - confesso que percebo pouco de economia política - foi necessário alterar o teor do documento inicial, uma vez que as propostas aí inscritas manifestaram-se insuficientes para o combate à redução do deficit e da consolidação orçamental de que a economia portuguesa tanto necessita.
Como referi, no acima citado, pouco percebo de economia política e o que sei advém-me de um mero conhecimento empírico que deriva da necessidade de ter de gerir as economias mensais de uma família. Neste aspecto assemelho-me a tantos milhares de portugueses que se encontram na mesma situação.
A minha consciência, associada à responsabilidade para com o meu país, faz-me entender a necessidade de tomada de decisões, opções político-económicas, que pretendam evitar o descalabro ocorrido na Grécia e garantir que Portugal consiga transmitir, para o exterior, uma segurança e uma firmeza, nas decisões tomadas, que sejam indiscutíveis aos olhos dos mercados internacionais. Dito de outro modo, para continuarmos a dar credibilidade e confiança na nossa economia para que possamos continuar a beneficiar dos apoios económicos e dos empréstimos que a suportam.
Somos um país dependente do exterior, por não produzimos o necessário de que necessitamos e, por isso, vemo-nos obrigados a comprar fora o que dentro não temos, isto é, de modo a suprir as faltas existentes.
As nossas indústrias fecham, a agricultura anda pelas ruas da amargura, as pessoas vêem-se, de um momento para o outro, sem trabalho e sem recursos económicos para poderem sobreviver face às obrigações mensais a que estão sujeitas, recorrentes da saúde, educação e cuidados básicos de que necessitam. Os sacrifícios pedidos aos portugueses deverão, para muitos, assemelharem-se a insultos, tendo em conta a situação precária em que já vivem. Basta haver um aumento do IVA e todos os portugueses passarão a pagar mais caro produtos e serviços, muitos deles essenciais. A medida afectará todos, independentemente do patamar económico em que se encontrem.
Ouvindo-o, com toda a atenção e preocupação, percebi que com estas medidas, agora introduzidas, V. Ex.ª pretende, ainda este ano, baixar em dois pontos percentuais, de 9,3 para 7,3, o deficit existente. Para alcançar tal objectivo irá diminuir as despesas do Estado (!!!) e aumentar as receitas. Recordo que num passado não muito longínquo, esta solução fora já tomada, sem resultados que se notassem.
Como chefe do governo a que preside, e escolhido para estar à frente dos desígnios deste país, compete a V. Ex.ª tomar as decisões que aprouver, colocando acima de todos os demais os interesses nacionais.
Sou portuguesa, cidadã que sempre pagou os seus impostos, funcionária pública que teve a progressão na carreira congelada desde 2005, e, por isso, sinto-me à vontade para dirigir a V. Ex.ª esta missiva.
O esforço que fiz, tal como muitos outros na minha situação não resultou, repito, uma vez que a situação se agravou. Sei que responderá “o contexto internacional alterou-se nos últimos tempos e despoletou uma bola de neve quase incontrolável, da qual o governo não tem culpa, nem poderia adivinhar”. O certo é que a constatação de tal facto entristece-me e desmotiva-me, pois sinto que o que me foi imposto não contribuiu para a solução do problema.
Senhor Primeiro-Ministro, Engº José Sócrates, ao terminar, agradecia-lhe que não se esquecesse que Portugal somos todos nós, cada qual com as suas funções e cargos, mas todos com os mesmos direitos e deveres, já que vivemos num regime democrático.
Não seria a altura do exemplo do que nos pedem começar a vir de cima para que possamos voltar a acreditar nas boas intenções dos nossos governantes e dos que ocupam cargos públicos e políticos de gerência e direcção? É que pedir sacrifícios e depois verificarmos que quem mais pode continua a não contribuir, proporcionalmente, como os outros portugueses, leva-nos a questionar sobre a veracidade da democracia em que vivemos e da pertinência do que nos pedem.
Terminando de um modo semelhante ao de um passado longínquo, mas sem qualquer intuito revivalista de regresso ao mesmo, despeço-me, acreditando que ainda há esperança para o meu país: O Portugal que deu novos mundos ao Mundo!
A bem da Nação!
Uma cidadã preocupada.