Translate

domingo, 14 de março de 2010

O "Graal"

A certeza sufocante de aprisionamento, dentro da própria vida, é a grilheta apertada que entrava os movimentos almejados.
A liberdade, sem a responsabilidade, não valoriza os actos praticados. E ser-se livre implica muitas vezes, senão a maior parte delas, uma grande força de vontade aliada a uma enorme coragem.
Sendo seres gerados à imagem e semelhança do Criador, o seu desejo é que encontremos a felicidade e a possamos viver de um modo recto e verdadeiro.
O alcance deste fim supremo é o “graal” que todos buscamos, independentemente do que cada um possa entender pelo “ser feliz”.
Se para alguns o caminho a percorrer, na busca da felicidade, é amplo, plano e largo, para outros, porém, o trajecto a percorrer é composto de obstáculos que dificultam a passagem e entravam a força de vontade de ir mais longe.
Tal como o piloto de uma embarcação, que no alto mar, num dia de tempestade, luta contra a força destruidora dos elementos naturais que se entre conjugam, impedindo o avanço da embarcação, também na vida, há momentos, etapas que, contrariamente à vontade da pessoa, conspiram entre si, obrigando-a a desistir, por tempo não contado, de trilhar o difícil caminho da felicidade.
São momentos desoladores, quase de desistência, em silêncios acobardados de solidão procurada.
A felicidade é uma prioridade, que nos permite enfrentar as agruras da vida com um sorriso nos lábios e o coração transbordando de sentir. Com ela tudo se torna mais fácil, mais leve e construtivo.
A conquista da felicidade, nalguns casos, é uma bênção, mas na maior parte das vezes é uma luta dura, feita de coragem e querer.

" O Rei Vai Nu"

"Se o meu destino é sofrer, dando aulas a alunos que não me respeitam e me põem fora de mim, não tendo outras fontes de rendimento, a única solução apaziguadora será o suicídio".

“Professores e pais da Escola Básica 2.3 de Fitares, Sintra, manifestaram-se hoje, sexta-feira, indignados com a associação entre o suicídio de um docente e a indisciplina dos alunos, argumentando que o caso está a perturbar os estudantes.”
In Jornal de Notícias de 13 de Março de 2010

Na sequência do assunto do post anterior e devido à notícia divulgada pela comunicação social do suicídio de um professor da Escola Básica 2º e 3º Ciclos de Fitares, seria impossível não opinar sobre o sucedido já que o faço com conhecimento de causa e é uma matéria que me toca particularmente.
Na sexta de manhã, dirigia-me para o trabalho e, maquinalmente, como é hábito, liguei o rádio do carro. As notícias das oito da manhã começavam. Logo na síntese inicial a curiosidade foi desperta pelas palavras do locutor sobre o suicídio de um professor. Aguardei o seu desenvolvimento e não me surpreendeu nada, quando fiquei a saber que o acto deste professor se deveu ao modo como alguns alunos o tratavam nas aulas.
Professor de cinquenta e um anos, leccionava a disciplina de Música, numa nova escola.
Ser-se novo implica, desde logo, uma adaptação ao meio que se desconhece. Tudo leva a querer que seria uma pessoa com problemas de auto-estima, que a enfraqueciam psicologicamente.
Quem conhece, por experiência própria, o ambiente vivido no interior da maior parte das escolas públicas portuguesas, não tem qualquer dificuldade em entender a pressão a que este professor terá estado sujeito.
Quando as situações de perda de autoridade se prolongam por demasiado tempo, devido a anos sucessivos de pressão constante por parte de contextos educativos cada vez mais degradantes, em termos de autoridade do professor, impotência na resolução dos mesmos, sentimento de solidão e falta de solidariedade, dos seus pares, na ajuda da situação, falta de respeito e educação dos mais novos perante alguém bem mais velho e hierarquicamente acima, uma auto-estima cada vez mais enfraquecida: estão reunidas as condições para o desfecho trágico que acabou por ocorrer.
Como referi, a notícia não me surpreendeu: revoltou-me, entristeceu-me, desanimou-me, até.
E a revolta cresceu ainda mais, quando li as várias intervenções que se sucederam após a divulgação da notícia: de alguns encarregados de educação dos alunos deste professor; de colegas seus; das diferentes estruturas da escola.
Não acredito que ninguém soubesse de nada! Não acredito que o que acontecia na aula deste professor não fosse sabido pelos alunos da escola, pois isso é impossível num meio destes. Indigno-me que, perante a morte de um ser humano - deixou escrito o porquê do acto que ia praticar - sejam, agora, postas em causa, por parte daqueles que são os primeiros responsáveis pela educação dos jovens na escola - os pais - , as razões deixadas pelo próprio, querendo, com esta actuação, sacudir as responsabilidades, que lhes deveriam ser exigidas, pelas condutas dos seus educandos.
Não entendo a razão da necessidade do anonimato, no prestar de declarações, ainda por cima quando as mesmas dizem que nada se passava, que nada se sabia, por parte de quem, nem em morte, conseguiu mostrar um pouco de solidariedade por um colega que estava, desde o início do ano lectivo, a ser alvo de comportamentos desajustados, desrespeitadores e psicologicamente violentos, por parte dos alunos.
Não entendo, nem admito, que os pais, perante a gravidade do sucedido - a morte de um ser humano - elejam, como principal problema, a necessidade de um acompanhamento psicológico para os seus filhos, em vez de se preocuparem com os «monstros» que ajudaram a criar.
Fugir das reais causas dos problemas, criar manobras de diversão, sempre foram as maneiras mais fáceis de se iludir o problema, numa fuga para a frente nem que seja com tropeços e muitas quedas.
Não enfrentar as consequências dos nossos actos, não reflectir sobre o que fazemos, não admitir a co-responsabilidade nos acontecimentos, iludir a consciência com falsas premissas, só conduzirá ao adiamento do problema. E, enquanto isso acontecer, continuaremos a contribuir para a formação de cidadãos inconscientes, irresponsáveis, imaturos e egoístas.
Que futuros adultos estamos a formar para uma sociedade que se quer consciente, participativa, responsável, para o bem de todos?
Só posso concluir que algo vai muito mal no campo da Educação!