Este pequeno texto é a minha modesta homenagem a um grande homem da cultura.
Aos noventa e dois anos, Vitorino Magalhães Godinho, historiador e professor catedrático da Universidade Nova de Lisboa, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, iniciou uma outra etapa da sua existência.
Ao ler a notícia da sua morte recuei ao tempo de faculdade e relembrei o primeiro de cinco anos inesquecíveis.
Vitorino Magalhães Godinho ministrava a cadeira de “História das Mentalidades”.
As suas aulas eram autênticas dissertações de cultura. O conhecimento que demonstrava, fazia-nos sentir muito pequenos.
De todos os professores era o que se mantinha mais distante dos alunos: ar sério, porte distinto, voz monocórdica, provocava em nós, meros caloiros, uma sensação de pânico perante a simples hipótese de sermos interpelados.
Naquele ano, nenhum aluno ficou dispensado do exame final que consistia numa oral.
O nervosismo sentia-se nas conversas de corredor, nos risos despropositados, nos gestos efusivos, enquanto esperávamos o início da prova.
O acto solene começou logo pela manhã: Um a um, lá íamos entrando para o “calvário”. A inquietação e o desassossego aumentavam à medida que os examinados iam saindo, da “sala da tortura”, desfeitos em pranto.
Perante tal cenário, era impossível não se ser invadido por um medo contagiante: o medo de pouco sabermos face ao pilar do conhecimento, o medo de expormos a nossa ignorância.
Por entre a solidariedade que se estabeleceu, recordo claramente as palavras maduras, de alguém bem mais velho, que me têm acompanhado desde então e que continuam a surtir efeito em situações semelhantes: “Em cuecas, o professor é igual a outro homem qualquer, não há que ter medo!”.
Hoje sorrio ao relembrar o sucedido.