Contextualização
(espacial, temporal e situacional): sala de aula; final da primeira semana do
ano lectivo; avaliação diagnóstica no domínio da escrita em que se solicitava a
redacção de um texto narrativo, no qual o aluno tinha de relatar um episódio
inesquecível da sua vida escolar, real ou imaginado, passado numa determinada
zona da escola, na companhia de colegas e/ou de professores.
Era este o tema
pedido para a composição. O que se seguiu é o assunto da minha reflexão.A primeira dificuldade dos alunos residiu em encontrarem, nalgum momento das suas memórias, um episódio marcante, digno de ser relembrado. Logo de imediato, para aqueles que não o tinham (ainda eram bastantes) surgiu o segundo grande obstáculo: imaginar, voar com o pensamento, reconstruir a partir do real, esculpir as ideias e modelá-las em palavras.
Estou a falar de jovens com onze, doze anos, a entrarem no sexto ano de escolaridade, com a frequência de cinco anos lectivos, o equivalente a cerca de quarenta e cinco meses de convívio, quase diário, mil trezentos e cinquenta dias de vivências partilhadas, dentro e fora de salas de aula, em contexto escolar e não conseguirem seleccionar, de entre tantas situações ocorridas, nenhuma especial que lhes tivesse tocado? Como se a Escola lhes passasse pela vida, em bicos dos pés, despercebidamente, deixando ténues pegadas neste percurso.
E o convívio? E as brincadeiras geradoras de laços vinculadores da amizade e do companheirismo, essência de relações que perduram para o resto da vida? Restam apenas memórias esbatidas desses momentos, sem significado afectivo, despejados de emoções?
E a capacidade de idealizar a partir do concreto, tão própria desta faixa etária? Onde se encontra? Perdeu-se? Não me parece, continua a existir em cada criança, em cada jovem, apenas se diluiu porque não é exercitada.
Esta geração nasceu e cresceu num tempo em que tudo, para além de ser dado, já vem formatado (os brinquedos; os entretenimentos; as situações; os rituais; os modelos; as manifestações das emoções; a vida, menos a capacidade de imaginar!).
Há muitos anos, num outro contexto, o poeta bradava “Não há machado que corte a raiz ao pensamento (…) ”. Caro poeta, quando o exercício (deveria sentir-se como simples, fácil e natural) de libertar as ideias e recriar novas formas, livres, genuínas, se converte num tormento incorpóreo, então, o improvável, o inimaginável, o impossível, parece ter sido conseguido.